Cinza ou consequência II
Tem muita audiência cá em casa.
Os filhos seguem o show
Com o silêncio da missa
E com o riso espontâneo e alto quando é retorquimento,
Reviravolta e grosseria.
As lutas são apenas plausíveis, as intrigas
Nos bastidores transformam os valores
Em sentimento, e logo há chefes e acólitos,
Chantagem em nome do grupo, o galo canta
O pavão, e dá-se ao público
Os Bons e os Maus.
O maior sucesso vem ter decerto
Com aqueles que a assistência ama odiar,
E há muitos nomes de herói e de vilão,
Exactamente como nos comics de onde vêm os uniformes.
Proeza e brio, despeito e inveja, legítima
Fome de vingança são antes, durante e depois.
São o handicap das lutas que assim podem
Acrescentar pontos ao conto.
As histórias por continuação
Seguem por um equilíbrio instável de maldades.
Prevarica-se, bate-se à traição, engana-se o árbitro,
Que, de resto, não poucas vezes toma porrada também.
É que todos os combatentes, mesmo o Víscera,
São puros e simples, ou seja, tão impulsivos,
Tão ajustados aos músculos e aos epítetos,
Como a audiência sentada, levada
Aos bicos de pés pela atenção
Ou pelo furor poético.
Todos concordam com as regras por batota,
De maneiras que afinal um ganha e outro perde.
Tenho algumas saudades de mim diante dos filhos
Diante do meu Tintin outrora lido; mando-lhes
A ambos lembranças, aos inesgotáveis
De quando a própria repetição era reencontro
E nunca estava prestes a acabar.
O riso dá-me a ideia que era o mesmo,
Sendo outros o repórter de Bruxelas e o Fernando Rocha.
Não sei como chegarão estes ao enfado
Que haverá de ter começado nestas tolices.
Américo Lindeza Diogo, Pássaros que fazem zimzum. Tracção do nada
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