O mesmo se aplicará à «libertação»: será que a libertação, sob todas as suas formas, não terá sido ao mesmo tempo a realização e o fim da liberdade? É este o grande problema da modernidade.
O destino negativo do movimento da modernidade inscreve-se no facto de que tudo quanto pertencia ao imaginário, ao sonho, ao ideal, à utopia, foi transcrito para a realidade técnica e operacional. Esta materialização de todos os desejos, esta hiper-realização de todas as possibilidades, é uma desalienação radical. A realização é incondicional, já não há linha de retaguarda do mundo, acabou-se o impossível, já não há transcendência onde nos refugiarmos. Acabou-se o homem alienado: há apenas um indivíduo inteiramente realizado — virtualmente, bem entendido. A dimensão virtual monopoliza hoje todas as retaguardas do mundo e contém o real por inteiro, expulsando qualquer alternativa imaginária. Ora, o real morre verdadeiramente a partir do momento em que o imaginário deixa de o fazer funcionar, soçobrando assim no virtual. O indivíduo torna-se finalmente idêntico a si mesmo — a promessa do Eu foi realizada. Realizou-se a profecia de toda a História moderna, a profecia de Hegel, de Marx, de Stirner, dos situacionistas: o fim do sujeito separado. Mas não se realizou para melhor, apenas para pior: do Outro ao próprio, da alienação à identificação; da mesma forma que a profecia nietzschiana da transvaloração dos valores se realizou para o pior, nessa passagem não para além mas aquém do bem e do mal.
Jean Baudrillard, O paroxista indiferente. Conversas com Philippe Petit
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