15.7.24

Subjetivo e objetivo

Não vale alarmar-se. – Assaz difícil é decidir o que seja objectivamente a verdade, mas, no trato com os homens, não há que se deixar aterrorizar por isso. Existem critérios que para o primeiro são suficientes. Um dos mais seguros consiste em objectar a alguém que uma asserção sua é «demasiado subjectiva». Se se utilizar, e com aquela indignação em que ressoa a furiosa harmonia de todas as pessoas sensatas, então há motivo para se ficar alguns instantes em paz consigo. Os conceitos do subjectivo e objectivo inverteram-se por completo. Diz-se objectiva a parte incontroversa do fenómeno, a sua efígie inquestionavelmente aceite, a fachada composta de dados classificados, portanto, o subjectivo; e denomina-se subjectivo o que tal desmorona, acede à experiência específica da coisa, se livra das opiniões convencionais e instaura a relação com o objecto em substituição da decisão maioritária daqueles que nem sequer chegam a intuí-lo, e menos ainda a pensá-lo — logo, o objectivo. A futilidade da objecção formal da relatividade subjectiva patenteia-se no seu próprio terreno, o dos juízos estéticos. Quem alguma vez, pela força da sua precisa reacção em face da seriedade da disciplina de uma obra artística, se submete à sua lei formal imanente, à coerção da sua composição, vê desvanecer-se-lhe a prevenção do meramente subjectivo da sua experiência como uma mísera ilusão, e cada passo que dá, graças à sua inervação extremamente subjectiva, para se adentrar na obra, tem uma força objectiva incomparavelmente muito maior que as grandes e consagradas conceptualizações acerca, por exemplo, do «estilo», cuja pretensão científica se impõe à custa de tal experiência. Isto é duplamente verdadeiro na era do positivismo e da indústria cultural, cuja objectividade é calculada pelos sujeitos que a organizam. Perante esta, a razão refugiou-se toda, e sem janelas, nas idiossincrasias, acusadas de arbitrariedade pela arbitrariedade dos poderosos, porque eles querem a impotência dos sujeitos, em virtude da angústia frente à objectividade que só em tais sujeitos se encontra preservada.

Theodor Adorno, Minima moralia, trad. Artur Morão

Sem comentários:

Enviar um comentário