21.11.15

Transformar a cultura

«Há um curioso elo de ligação entre escritores e terroristas. No Ocidente, convertemo-nos em famosas efígies, ao passo que os nossos livros vão perdendo capacidade de dar forma ou de influenciar as pessoas. Costuma perguntar aos seus escritores o que é que pensam acerca disto? Em tempos acreditei que era possível a um romancista modificar a vida interior da cultura. Esse território, hoje em dia, foi tomado pelos pistoleiros e fazedores de bombas. Conseguem arremeter contra a consciência dos homens. Isso que os escritores faziam antigamente, antes de terem sido comprados.»
«Continue. Gosto de o ver zangado.»
«Mas isto já você sabe. Por isso é que viaja um milhão de quilómetros a fotografar escritores. Porque nós estamos a ceder o lugar ao terror, às notícias sobre o terror, aos gravadores e às câmaras de filmar, aos rádios, às bombas escondidas em rádios. Notícias de catástrofes, eis a única narrativa de que as pessoas precisam. Quanto mais negras as notícias, mais grandiosa a narrativa. Os noticiários representam o último vício antes de... de quê? Não sei. Mas você é esperta e captura-nos com a sua câmara antes de desaparecermos.»


Don DeLillo, Mao II 
(tradução de José Miguel Silva)




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