3.1.13

No dia 3 de janeiro de 1889


O Cavalo de Turim de Béla Tarr é um filme que nos esmaga. Dificilmente podemos recobrar do abalo que vê-lo nos gera. É sublime, na aceção de Edmund Burke. Um investimento forte na beleza da imagem e no cinema de sequência. Uma câmara deferente, que acompanha com subtileza os movimentos das personagens, do seu encerramento progressivo naquele casebre; do seu, até, devir-animal. Apesar de comovente, e às vezes mesmo pungente, é um filme que diz o que tem a dizer sem cedências algumas, usando os planos longos e as câmaras fixas que entende usar. A banda sonora empresta algum trágico àquelas existências, e a reiteração dela diz-nos de um sofrimento constante, que lentamente lacera aquelas vidas, sobretudo a da égua, também ela, como Nietzsche, aparentando uma destituição subjetiva, exposta, como só, ao que sabemos, os humanos o podem, ao absurdo da existência, remetida ao silêncio dos que não podem ter voz. Artaud dizia escrever no lugar dos analfabetos, dos pobres. Deleuze acrescenta: os escritores escrevem também no lugar dos animais. O exílio a que são votados pai e filha revela, e é importante ressalvar, o que é a lei natural - que gerara tamanha tempestade -, alheia ao exercício ético e, por extensão, ao julgamento moral. Talvez a filha seja, em termos estritamente nietzschianos, a única personagem fraca, pois vai-se apiedando da égua, humanizando-a, facto que sobremaneira reforça a nossa crença nas virtudes da linguagem verbal que, citando Bataille, não passa de comunicação fraca. Claro que tudo isto é conversa, em face deste filme forte, que reivindica uma linguagem cinematográfica, feita de planos belos e de sequências, algumas de plano fixo, outras não, e tendencialmente longas. Um filme que não vive do texto - mas da imagem, ancorada na representação e no som. Tudo tornará mais vívida a experiência de quem assiste ao filme. O que se consegue com mais cinema e não menos, como Rudolf Arnheim, nos idos anos 30 do século passado, afirmou.




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