4.9.23

O tempo não tem rosas

já quase não há razão para enlouquecer,
nesta tarde que tanto se assemelha à velhice, abro uma janela
e olho o vaivém do trânsito, olho transeuntes
cabelo pintado de branco pelo pó...
sento-me no coração desta utopia é como se
nunca tivesse sido jovem num ápice se vai o tempo
depressa demais! ontem à noite recordava
aquela árvore no sítio onde nasci
em todos os anos que decorreram desde então, afastei-me
demasiado
e estive longe dela demasiado tempo uma vida negligenciada
transformada como por magia
nos ossos da minha avó
tenho sempre a impressão de que há algo a cintilar lá à frente
mas quando lá chego encontro um monte de vidro partido
é deveras trágico. Torno as coisas difíceis para mim próprio
mas sempre disposto a ser complacente comigo,
o meu coração arrogante desvia os olhos, mesmo os meus
falhanços
são fracos por isso me deixo afundar mais
seguindo aquelas raízes de árvore sob a minha janela
de regresso à lama da minha terra natal

Duo Yu, Quinhentos poemas chineses, trad. Rui Cascais

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