20.3.23

John Berger, economia, corpo

Em face de um currículo assim, o sistema capitalista afirma que evoluiu e que as desumanidades do passado nunca mais poderão repetir-se. Esta afirmação está implícita em todas as comunicações públicas: vivemos — é-nos ensinado — num sistema democrático que respeita os direitos humanos. Os excessos do passado foram acidentais e não se devem à própria natureza do sistema.

É mau saber que não se é mais do que uma peça pequena na engrenagem. Limitamo-nos a olhar para o salário, a considerar o que isso significa para mulher e filhos. É a única resposta restante.

Começa a observar o braço como se este fosse movido pela peça que suporta, não pelo seu ombro. Pensa como se fosse a bomba hidráulica que movera o seu braço.

Os seus sentidos são assaltados pela irregularidade do que experimentam, mas se olhar em redor nada vê que seja irregular —irregular tal como o são as folhas de uma árvore, o andar de um animal —, à exceção do que já não se usa ou do que está abandonado: o líquido derramado pelo chão, os pedaços de material inútil; o dorso das suas próprias mãos, o rosto do homem que trabalha a seu lado.

Le Septieme Homme – Sendb00ks

Sem comentários:

Enviar um comentário