11.8.18

O que se prefere para outros

Custódio era o ponto onde o coração de Quina vacilava. Não casou, pois havia presenciado a desgraça de sua mãe, mas amou aquela criatura, com uma cegueira que a fazia mulher destrambelhada, ainda que os seus inimigos acentuassem a transformação com acinte. É com melancolia e felicidade que vê aquela falha, para si mesma, por certo, a mais decisiva. Preferia a brutalidade sem cálculo – apesar de tudo – ao fingimento e à manipulação, os quais, todavia, a fizeram multiplicar os seus bens. Se não se pode ser ingénuo nos negócios, pode-se sê-lo quando estão em jogo bens mesquinhos ou sentimentos, segundo uma hierarquia axiológica decerto duvidosa. Mas talvez isto nos diga como deixar uma natureza entregue a si mesma, uma natureza que não se moldou, não se refez, por uma reserva de amor que em nenhum outro lugar desaguava, tenha o seu quê de perigoso. Quina fez os outros segundo os seus próprios fins, mas renunciou fazer o mesmo com Custódio, cujas ingenuidade e falha de arteirice não poderiam tornar uma verdadeira ameaça, apenas provocariam algum vexame e, na hora da morte, nojo. Quina, de outro ângulo, fez uma não-ameaça que pudesse proteger, mantendo-a infatigavelmente na esfera repetitiva do afecto.

Sem comentários:

Enviar um comentário