A doença e a miséria outorgaram-lhe poucos anos, e, em cada ano, poucos meses, durante os quais, enfebrecido e esfomeado, ele teve o tempo de pintar, entre outros, um quadro magistral, destinado a exercer repercussão inigualável em qualquer homem verdadeiro, quadro esse pelo qual eu daria, se as tivesse, todas as telas modernas: o Homem agrilhoado. Um céu puro, azul sombrio, cambiante, alto, profundo, interminável, perigoso, distante, um céu que se retira diante da criatura. O desgraçado tem assim de ficar só. No céu, um enfermo, corroído por dentro e por fora, no corpo e nas vestes. Cai, porque um desgraçado nem por um instante pode parar na sua queda. De braços estendidos, traz neles grilhetas. O espaço crucifica-o. Para ele não há repouso, não há suporte ou apoio, da família, da sociedade, da segurança social, duma organização. Há apenas o espaço indiferente que o não distingue duma folha a esvoaçar, dum excremento de pássaro a cair, dum aerólito.
Este quadro, de uma magnetizante verdade, é toda a sua vida. Acrescentar-lhe o quê? E por que razão não se poderá ser o homem de uma obra só? Por que razão mais que uma obra para um só destino?
Henri Michaux, O retiro pelo risco (antologia)
Vim aqui parar, e ainda bem.
ResponderEliminarAdoro, adoro, adoro o ATLAS aqui em baixo.
Que coisa mais linda.
Agora sobre o Henri: grande.
Obrigado! Saudações!
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