A Törless, pelo contrário, essas coisas deixavam-no indiferente, e não tinha jeito nenhum para elas. No entanto, estava inserido nesse mundo e tinha diariamente diante dos olhos coisas que lhe mostravam o que significa ter o papel principal num Estado - sim, porque num internato como aquele cada classe é um pequeno Estado. Por isso tinha um certo respeito e temor pelos dois companheiros. A tentação que por vezes sentia de os imitar não passava de tentativas diletantes. Isso levava a que a sua posição em relação a eles, em parte também por ser mais novo, fosse a de um discípulo ou ajudante. Desfrutava da protecção dos outros dois, mas eles também gostavam de ouvir a opinião dele, porque a sua inteligência era a mais ágil. Uma vez seguido um caminho, era extremamente fecundo a imaginar as mais intricadas combinações. E ninguém era tão hábil como ele a prever as diversas possibilidades de comportamento de alguém colocado numa determinada situação. Só quando se tratava de tomar uma decisão, de assumir o risco de escolher uma entre as várias possibilidades psicológicas presentes e agir em conformidade, é que ele falhava, perdia o interesse e a energia. Mas agradava-lhe o seu papel de chefe de estado-maior secreto. Tanto mais que era a única coisa que trazia alguma animação ao seu profundo tédio interior.
Robert Musil, As perturbações do pupilo Törless
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