24.3.18

Em favor da crítica

Vês agora um erro nesta coisa que amaste antigamente como verdadeira ou como provável: rejeita-la para longe de ti e imaginas que a tua razão acaba de conseguir uma vitória. Mas talvez este erro, antigamente, quando eras um outro – nunca se deixa de ser um outro –, te fosse tão necessário como as tuas «verdades» de hoje; era uma espécie de pele que te escondia, te velava muitas coisas que ainda não tinhas o direito de ver. Foi a tua nova vida, não foi a tua razão, que matou em ti essa ideia: já não tens necessidade dela; desaba sobre ti, e a sua irrisão aparece à luz do dia, aparece rastejando como um verme. Quando exercemos a nossa crítica, não é arbitrariamente, não é impessoalmente, é, muitas vezes, pelo menos, porque há em nós um impulso de forças vivas em via de se libertar da sua casca. Negamos e somos obrigados a fazê-lo, porque há em nós qualquer coisa que quer viver e quer afirmar-se, alguma coisa que não conhecemos, que não vemos talvez ainda!... Lavremos à crítica este louvor.

Nietzsche, A gaia ciência


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