15.12.15

Taxi, de Jafar Panahi

Um plano para a cidade, Teerão, para a rua, de uma simplicidade e beleza desarmantes. A câmara do cineasta no lugar da câmara de vigilância é de uma ironia extraordinária. Depois, o táxi é a casa onde desta vez Panahi filma, e elabora as suas crónicas de costumes. A sequência dos primeiros passageiros registaa o paradoxal e fascinante numa cidade, seja ela Teerão ou outra: como é que pessoas com mundividências incompatíveis, vivem em conjunto? Num táxi, acontece um pouco de tudo. Em qualquer lugar, acontece um pouco de tudo, se conseguirmos ver. O olhar do cineasta é permeável, desencantado, compreensivo, aqui e ali de uma ira paciente (o que difere de condescendente). Com a entrada do contrabandista de filmes, percebemos logo que a intenção é encadear histórias umas nas outras, lançando a suspeita de que se trata de um documentário fake. A entrada da sobrinha do cineasta no carro é do melhor que tenho visto, diz que o pícaro sobrevém a tudo. E convém assinalar a sua arte: quando filma, Hana segue uma personagem da rua, depois outra, quando a anterior saiu de cena, depois outra, e assim sucessivamente. Dir-se-ia um Dziga Vertov. Captando o quotidiano de Teerão, filma um furto, perpetrado por um rapaz de rua. O realismo sórdido é pegar na câmara e dirigi-la ao mundo, tão simples como isso. De outra forma: sórdido é um adjectivo a mais. Um filme que nos ajuda a ser menos cruéis e mais vigilantes - e a manter uma distância em relação ao mundo, sulcada à vez pelo exercício crítico e pelo pícaro. A ironia final é o furto da câmara, a que afinal cumpriu o seu papel vigilante sobre as ruas de Teerão, as suas personagens-tipo, cujo lugar comum foi aquele táxi que viajava de forma errante. Como se Jafar Panahi devolvesse ao regime iraniano o olhar vigilante - desta feita não opressivo, mas crítico e pícaro.






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