11.6.15

o terceiro incluído, real politik


Foi quando quis estudar profundamente as declinações latinas
andava com C. no liceu do centro e queria viver sensações
verdadeiras. Conheci C., C. meteu conversa comigo
quando eu andava atrás de I., na lambreta de I. até ao convívio
com os ricos, pensava outrora, classe média recém-falida, andava atrás de I., sem
capacete, procurava sensações verdadeiras com I.,
enredava-me em rock, heavy metal, muito antes de descobrir
as cesuras & o proletariado, o punk, os dilemas da modernidade colocavam-se
à noite, o corpo pulsando,
pensando em I., sem imaginar C., quando C. decerto
já soñava comigo, noites dentro ainda antes de C. estar comigo
noites dentro, com os pais em viagem, e nós juntos, com new metal
e sem cesuras / e proletariado, a noite por fora auspiciosa no subúrbio
whisky e charros e os outros por fora, heavy metal
chegava, ainda não havia descoberto os humores de C., os meus humores
de proletário sem lugar, de proletário indigente, de indigente professor
de incoactivo proletário, nunca e jamais nascido, rememorado
das leituras nocturnas, rememorando dentro de C. as carícias os humores
do proletariado, ainda antes de C. se despedir de mim no macadame
irregular dos subúrbios por carros, conforto & cinema
sem saber mais o que fazer pelas noites dentro, sem C., sem I. e
até sem R., real de fora, simbólico sem capital, imaginário de cinema
recrudescendo noites dentro o proletário sem lugar, ainda
perseguido pelos seios de C. noites dentro
os humores negros nos seios de C., os seios de C. do meu imaginário
o whisky e os charros, as manhãs ressequidas depois de noites
dentro. I. era urbana, desejava vaidades e roupas
novas, cuidava rapaz de sua condição sem sabê-lo,
um rapaz, enfim, apessoado de gosto afim
denodo & desfaçatez, linguajar com denodo & desfaçatez,
bem antes de usar gravata e dos dias passados no ginásio
olhando o espelho, desprezando lenine & as fufas, I. definia a sua condição,
os bons olhares de seus pares, chegada do subúrbio,
ainda antes de cismar com os seios de C., por boqueirões
por becos, ainda antes de imaginar sequer, de cismar ouvindo heavy metal
e new metal, I. tinha compaixão de sua classe na lambreta, eu nada empreendedor
sem denodo nem desfaçatez, sem linguajar, muito antes de ouvir falar
de deleuze, do falar sujo das viagens, das conferências, dos cafés e dos gnomos
oscilava entre whisky e heavy metal, os seios de C., ainda antes de conhecer
os três seios de novélia, a latrinografia, o mundo como cesspool, nascendo
e renascendo por interposta fábula, thomas b. tuberculoso, sábados
angustiantes antes de domingos menos angustiantes todavia.
I. procurava músculos & desfaçatez
narcisismo de classe, denodo das noites de camisa desabotoada, peito
liso, sapatos de vela, carros de alta cilindrada, cavalos prontos
para a revolução de direita, teologia política, o capital, o deus secularizado,
noites dentro pelas discotecas, whisky e sapatos de vela, gin e linguajar,
bem depois dos seios de C., das pernas de C.
do rosto de C., do amor de C., bem antes de C. ser o real que volta sempre
o real no seu lugar, o capitalismo no seu lugar, bem antes do proletário
sem lugar descobrir o real no seu lugar, descobrir o proletariado burguês
antes do proletariado burguês se ter tornado lumpen-proletariado, antes
do proletariado burguês haver descoberto que o capital é a natureza,
que as máquinas são natureza, que a natureza é desconfortável
ao contrário da frivolidade calma do plástico, do metal e do betão
tão calmos, tão calmos em dias de canícula,
que a teologia política é os nossos dias, que o capitalismo é a realidade,
falem do capitalismo aos esquizofrénicos como terapia,
imagens sem nada por dentro, o amor de C. dentro das imagens,
o gin & o linguajar pelas noites dentro, leituras pelas noites dentro,
áscuas do silêncio recrudescendo, singularidade rebarbativa,
utopia doce, acasos de molly bloom sentindo-se observada,
somos seres olhados, públicos, mas o grande outro não existe
é paranóia, actos falhados, ensimesmamentos, avanços de b. boylan,
racismo ciclópico, dívida de j. hynes, dívida infinita, padralhada,
antes de I. descobrir o seu lugar, drama & revistas de chacha, mas I. interessava-se,
pensava eu, de t-shirt berrante, sumptuosa, jogando futebol,
caceteiro como alguns poetas, teologia política, manifestos,
melancolia & os seios de C., um século de cadáveres, de teologia
política, de amigos e de inimigos, bem antes de inimigos
emigrarem, a cultura emigrar, para só ficar a natureza,
o capitalismo no seu lugar, jogando futebol e lendo revistas de chacha,
I. com muito tempo, com o seu linguajar e o seu denodo, com o
seu desprezo sorridente e com denodo, o linguajar sorridente
da revolução, dos amigos eternos da natureza, do século de cadáveres
da teologia da emigração, da actualidade. Entretanto C. casou, teve
filhos e tem carro e casa e lava a roupa, cuida dos filhos, não faz contas
às vezes ainda penso nos seios de C., nos amigos seios de C. pelas
noites dentro, lendo poemas do século passado, amigos e inimigos,
comprando pela noite dentro, a natureza teológica do mercado,
os seios de C. & os meus humores negros, deitado para o tecto,
ainda as tardes altas do verão, os corpos no verão, o meu corpo,
o corpo de C. real, real por fora e por dentro, do meu corpo
real por fora e por dentro, em cidades irreais por dentro do inverno
pardacento, leituras desviadas das grandes estantes policopiadas,
a noite do século de cadáveres, e todavia sonhando com C., os seios de
C. no filme de godard com humores europeus, a felicidade americana,
somos todos americanos, com carro, côna & roupa lavada, teologia
política arrostada pelos corredores dos hospitais, C. e seus filhos
no hospital privado, sem listas de espera e paredes cor-de-rosa,
com palavras lindas & denodo, os grandes textos clássicos anoitecidos
enquanto I. ainda procura músculos & denodo, C. quieta em sua
casa, as casas as casas as casas, tudo são casinhas, imaginando C. imaginando-me
real e simbólico, depois das cartas que lhe enviei, escritas com
furores pessoanos em tardes de bernardo soares, portugal não é a mensagem
portugal é o livro do desassossego, portugal são os humores europeus
e a natural teologia política, os seios de C. e ainda assim, os clássicos anoitecidos,
cum tamen inter se uersus ac uerba necessest / confiteare et re et sonitu distare sonanti
o camelo na sopa, as partículas elementares, o corpo de C. ainda
palpitando junto ao meu, o corpo de C. dilatado, excitado, os seios de C.
na turbulenta aspiração do meu corpo, tremendo de furor de
seus humores europeus, a felicidade americana todos os dias
todas as imagens são felicidade americana, são teologia política,
a origem em cada nova imagem ainda mal nascida,
de lambreta com I., I. conduzindo a lambreta de volta ao subúrbio,
falava-me das suas amigas, do liceu, quando comecei a estudar
declinações latinas, cícero, vergílio, horácio, horários, os casos e as desinências
antes de me terem dado lições de denodo & gin, boas maneiras
no cagar e no interpretar, os seios dilatados de C. no vapor do verão
onde entram as pessoas e os poetas inflados
a felicidade americana de C., o carro americano, o cinema americano,
o sonho urbano dos subúrbios, a arte depredada, C. aprendia a andar de patins
e eu andava longe de ter lido céline, de saber do destino de férdinand
cagando nas boas maneiras, eu falava a língua limpa do argot,
sabia de sua voracidade, animalidade, humanidade, ainda sonhando
com os seios de C., a boca de C., o corpo de C., as mãos de C.,
bem antes das indecisões de b. bardot no desprezo,
as metonímias, as metáforas, os objectos pequenos,
o corpo de C., o meu corpo, espaços lisos,
excessivos na natureza teológica dos dias,
não sabíamos o que fazer deles, da potência, das ligações,
cismando ao balcão da loja de ferragens ou limpando o chão do café,
na cidade, passeava depois na cidade os meus humores europeus,
relutante homem-sanduíche, proletário burguês deslocado,
antes de ser desovado, stephen diante do mar viscoso,
da mãe perdida entre leituras anoitecidas,
desterrado pela teologia política, o corpo de C. agora côna lavada,
filhos criados, roupa de marca, férias marcadas,
e I. destemperada por gin & músculos e eu menos insciente porventura.

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