15.12.13

«Elena» de Andrei Zvyagintsev

Aprecio estes planos pulposos, hápticos. Não são o fim, pois há uma narrativa a ter em conta. Alguns desses planos criam uma atmosfera quase asséptica, lugar de um burguês filisteu que cuida do seu corpo.

Há um certo suspense no filme. Suspense contemplativo, por assim dizer.

Afim, de resto, daquele que a experiência do mundo nos oferta. Não há soluções nem explicações simples. O mundo é complexo; uma chatice, essa coisa do ser humano.

Nem Katya é o que parece, nem a relação com o pai, dois exemplos.

Elena é heroína por ter que decidir. Todo o peso está sobre si - e não há Deus que a salve. É bem o arquétipo do herói dostoievskiano.

Propuseram a Andrei Zvyagintsev fazer um filme sobre o Apocalipse. Saiu Elena. O Apocalipse é decidir sem Deus como superego, com o peso de certezas precárias.

Não vale a pena diabolizar o dinheiro. Elena parece a dado momento o palco de uma luta ideológica. O dinheiro pode levar mais felicidade ao maior número? Ou não? Ou será tão-só a confiança uns nos outros suficiente? Quando o Estado não salvaguarda os seus cidadãos, a decisão é delegada no indivíduo. 

Será, assim, tudo uma questão de vontade individual? Vladimir parece assim pensar, embora dizê-lo obnubile tanto a proteção paternal que concede à sua cria como a incapacidade pesporrente em admitir erros na educação de Katya.

O eixo do filme é a decisão de Elena: um salto de fé. Dado que desconhecemos os efeitos dessa decisão, a obra de arte de Andrei Zvyagintsev deixa de poder apenas ser lida em clave ideológica. Não nos dá o cineasta uma fórmula que explique as coisas, não acedemos a uma resposta apaziguadora. Centra-se na decisão de Elena - um ato. Um ato é um acesso de loucura, como disse Kierkegaard. Agir não é um acontecimento lógico numa cadeia de razões. Um «acto bem conseguido induz, por definição, um curto-circuito; cria retroactivamente as condições da sua própria possibilidade.» (Slavoj Zizek) Um ato cujo objetivo é utilitarista: levar a felicidade ao maior número. Há que ressalvar, contudo, que esse maior número são os seus netos e filho.




 

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