14.7.13

Poéticas da montagem

O assassinato mais célebre da história do cinema é um efeito da montagem. Os cortes na carne de Marion Crane são criação dos cortes elaborados na mesa de montagem. Só depois de por aqui passarem, é que os filmes terminam (talvez por esta razão os atores que trabalhavam com Hitchcock tivessem não raro a perceção, durante a rodagem, de que os filmes eram péssimos...).



Mutatis mutandis, a melancolia em Ruy Belo é desde logo efeito de retórica. Paronomásia, rimas internas, rimas em eco, aliterações, assonâncias, são, afinal, expolitio. A arrumação do significante qua significante engendra significado.


Às vezes sabes sinto-me farto
por tudo isto ser sempre assim
Um dia não muito longe não muito perto
um dia não é que eu pareça lá muito hirto
entrarás no quarto e chamarás por mim
e digo-te já que tenho pena de não responder
de não sair do meu ar vagamente absorto
farei um esforço parece mas nada a fazer
hás-de dizer que pareço morto
que disparate dizias tu que houve um surto
não sabes de quê não muito perto
e eu sem nada pra te dizer
um pouco farto não muito hirto e vagamente absorto
não muito perto desse tal surto
queres tu ver que hei-de estar morto?



Sem comentários:

Enviar um comentário