28.12.25

Mostrar a vida como aparece no sonho

A vida em sonho

Muitos de nós inventam as pessoas e apaixonam-se não por uma pessoa real, mas pela ideia com a qual envolvemos essa pessoa, como um vestido que geralmente não lhe fica bem. Que desencanto, quando nos apercebemos disso! Ou melhor, apercebemo-nos disso quando surge o desencanto, quando deixamos de amar. Muitas das personagens de Tchékhov funcionam assim, sonhadores que não reagem segundo a realidade, mas segundo a sua própria imaginação. Se não fosse assim, a jovem Sacha ter-se-ia apaixonado por aquele homem gasto, prostrado, que é Ivanov? «Ela ressuscitará aquele que caiu... Não é Ivanov que ela ama, mas essa tarefa», observa Tchékhov.
Para representar o escritor Trigórin, em A Gaivota, Stanislávski vestira-se com elegância. Tchékhov diz-lhe que não pode ser assim: «Ele veste umas calças aos quadrados e sapatos esburacados.»
Isto significa que Nina fica apaixonada não pelo verdadeiro Trigórin, personagem bastante mesquinha, mas pela ideia que ela tem de um escritor. Está apaixonada pelos seus próprios sonhos.
Numa réplica da mesma peça, Tchékhov diz-nos do modo mais claro possível como evita a alternativa proposta pelo velho Sófocles: «Temos de mostrar a vida não tal como ela é, nem como ela deveria ser, mas tal como ela nos aparece em sonho».

Roger Grenier, Olhai a neve a cair. Impressões de Tchékhov


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