23.1.11

Exercício

Continuação das palavras de Gonçalo M. Tavares: "Dois lutadores de sumo. Treinaram vinte anos. O seu peso enorme, os rostos ameaçadoramente contidos. Imóveis, os dois corpos. Prontos para a acção."


O senhor Tatsumi avançou. Parou por um momento, por dentro, enquanto o seu braço por fora se alongava, pesadamente, ao encontro do pescoço do adversário. Mas aquilo em que se detinha a sua atenção era interior e crescia; enchia a consciência de tédio, com alguns dos momentos que vivera, uns sons desencontrados da música que escutara, e outras imagens de corpos incompletos que havia desejado. O adversário levemente imobilizou Tatsumi; as suas mãos pensavam por si, o seu corpo seguia o seu próprio desejo, como se não houvesse movimento (isto é, sem que uma intenção, necessariamente cosa mentale, parecesse determiná-lo). Tatsumi caíra, e então os rostos da plateia morriam, estavam numa improvável imobilidade; já não eram um fluxo visual, já não eram movimento; já não eram rostos, portanto. As vitórias na arena são isto: suspensão do que de pessoal se pensa, denegação. Despojamento, o corpo sem dobras, ao encontro de um outro corpo com força sem dentro.

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