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Isabelle está
apenas interessada em experimentar. Não encontro motivação psicológica ou de
outra natureza: nem desengano, nem compensação narcísica, nem frustração.
Apenas o desinteresse da adolescente – para mim o filme é sobre um período da
vida humana, não sobre esta adolescente – por tudo. A esse desinteresse soma-se
o cálculo das possibilidades da existência. A melancolia adolescente decorre
sobremaneira da abertura do mundo: que vou ser, que vou fazer, há opções, devo
escolher. Da consciência de que não há ordem. O negrume, servindo-me da
expressão de Luís Miguel Oliveira, tem esta origem, do meu ponto de vista. Não
vejo em Ozon nenhum fundo moral – somente o tratamento belo e corajoso da
adolescência, sem cedências à grelha politicamente correcta. Como sucede no
cinema de Haneke, por exemplo, também Ozon se serve de personagens da classe
média/burguesia: Marine não é prostituta por ser pobre e, por aí, torna-se
inescapável uma leitura estética do filme, o qual não cede às determinações
redutoras de muita sociologia, que concebe o ser humano como um produto das
circunstâncias, isto é, como um ser sem liberdade e sem ethos. Isabelle exerce a sua liberdade, experimenta-se, procura com
algum alheamento uma ordem. A melancolia é a nostalgia da ordem: Isabelle
subindo as escadas rolantes da estação metropolitana, dirigindo-se a um
não-lugar, o hotel, encarnando a gestora que executa de forma liminar a sua
função. Uma cara para a família, outra para o trabalho. E muito cruamente a
prostituição – a auto-mercantilização – como o mais frequente comportamento do
neurótico contemporâneo. De certa maneira, Isabelle executa o que dela espera a
comunidade. Isabelle decide prostituir-se depois de assistir a uma reportagem
sobre a prostituição entre as estudantes universitárias (toda a negação tende a
engendrar uma denegação). E nessa vertigem procura todavia um pouco de ternura,
da ligação humana sem o espectro do interesse (um clássico do cinema e da
vida). Françoise Hardy partilha com Isabelle o mesmo desamparo mas com matizes
diferentes. Hardy vem revelar o negrume – esse sim – da idealização amorosa,
que jamais havia sido feita por Isabelle. Se tivesse levado Rimbaud a
sério, arrisco ao pensar neste encontro, Françoise Hardy teria sido uma Isabelle.
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